segunda-feira, 30 de agosto de 2010

Pequena Biografia 

Vinicius de Moraes foi muito mais que nosso "Poetinha", apelido carinhosamente atribuído a ele. Marcus Vinicius da Cruz de Melo Moraes foi compositor, intérprete, escritor, jornalista, advogado, diplomata. Uma pessoa que viveu a vida ao máximo, passou uma metade dela viajando, a outra amando (teve nove casamentos).

Nascido no dia 19 de outubro de 1913, era um apaixonado pelo mundo.Daí suas escolhas profissionais, em todos os sentidos. Obcecado pelo dom de viver, Vinicius sempre procurou fazer aquilo que lhe proporcionasse prazer.

A carreira diplomática começou em 1943, trabalhou como vice-cônsul, entre outros cargos.

Tais atividades só foram interrompidas em 1968, quando foi punido pelo Ato Institucional n. º 5 com aposentadoria compulsória do Itamaraty, depois de 26 anos de (bons) serviços prestados.

O jornalismo e a crítica de cinema foram outras ocupações profissionais.Trabalhou nos jornais Última Hora, A Manhã, Suplemento Literário, O Jornal e na revista Clima, entre outros lugares. Em 1936, ele foi nomeado representante do MEC na censura cinematográfica, onde, nas sessões, apenas dormia e nada censurava. Uma atuação mais animada e engajada viria em 1947, com a fundação da revista Filme, da qual ele participou e manteve contato com diretores famosos como Orson Welles e Walt Disney.

Viajante que era percorreu a Europa em 1952 com o objetivo de estudar a organização dos festivais de Cannes, Berlim, Locarno e Veneza. Em 1966, foi membro do Júri Internacional de Cannes.

Vinicius era admirado não apenas por sua obra. Antes de poeta, ele foi uma pessoa querida por todos seus companheiros, parceiros e amigos. Um carioca da gema,como podemos definir pelo seu amor à cidade, que pode ser comprovado através dos sonetos e músicas. Nosso poetinha faleceu no Rio de Janeiro em 9 de Julho de 1980, mas seu legado ainda está presente nos corações dos apaixonados. Apaixonados pela vida, acima de tudo.

Vinicius e as Mulheres 



"São demais os perigos desta vida
Pra quem tem paixão principalmente
Quando uma lua chega de repente
E se deixa no céu, como esquecida
E se ao luar que atua desvairado
Vem se unir uma música qualquer
Aí então é preciso ter cuidado
Porque deve andar perto uma mulher..."


Em todos os casamentos desfeitos, a mesma cena se repetia.Ele ia embora praticamente com a roupa do corpo, levando consigo, no entanto, a certeza de que seu coração sempre estaria aberto para paixões novas e avassaladoras.

As mulheres - de vedetes a intelectuais - sempre foram fonte de inspiração máxima da obra de Vinicius de Moraes.

Ele vivia alegre e com intensidade assustadora. Como grande artista que foi, Vinicius fez com que toda a emoção e delicadeza de cada um de seus encontros e desencontros fizessem parte de sua magnífica obra.

Em entrevista concedida à Clarice Lispector, Vinicius de Moraes fala sobre o amor e sobre as mulheres:

C.L:- Você acaba um caso porque encontra outra mulher ou porque se cansa da primeira?

V.M. - Na minha vida tem sido como se uma mulher me depositasse nos braços de outra. Isso talvez porque esse amor paixão pela sua própria intensidade não tem condições de sobreviver. Isso acho que está expresso com felicidade no dístico final do meu soneto "Fidelidade": "que não seja imortal posto que é chama / mas que seja infinito enquanto dure". 

E assim Vinícius falava sobre o amor:

Soneto do Amor Total 

Amo-te tanto meu amor... não cante
O humano coração com mais verdade...
Amo-te como amigo e como amante
Numa sempre diversa realidade.

Amo-te enfim, de um calmo amor prestante
E te amo além, presente na saudade.
Amo-te, enfim, com grande liberdade
Dentro da eternidade e a cada instante.

Amo-te como um bicho, simplesmente
De um amor sem mistério e sem virtude
Com um desejo maciço e permanente.

E de te amar assim, muito e amiúde
É que um dia em teu corpo de repente


Vinícius e seus parceiros 


Mais do que parceiros Vinicius colecionou amigos e admiradores de sua obra. Companheiros de boêmia, do cotidiano, de rimas e notas musicais, eles formaram a fina nata da Música Popular Brasileira, junto ao 'Poetinha'. Os principais deles foram:

TOM JOBIM 

Em 1955, Vinicius montaria a peça Orfeu da Conceição, com música a cargo de um então jovem pianista: Tom Jobim. Surgia assim uma parceria que se estenderia por toda a vida profissional e pessoal. Uma série de intérpretes gravou composições inesquecíveis da dupla, como Canções do Amor Demais, Luciana, Estrada Branca, Chega de Saudade, Garota de Ipanema, dentre outras. Mais do que ninguém, Tom foi o grande amigo.

CARLOS LYRA 

Os dois se conheceram em 1961, ano em que compuseram juntos Você e Eu e Coisa Mais Linda. Outras composições da dupla são Primeira Namorada, Nada como ter Amor e A Marcha da Quarta-feira de Cinzas.

BADEN POWELL 

A parceria com o violonista começou em 1962, ano em que foram compostas as belas Samba da Bênção, Tem Dó, Samba em Prelúdio, Consolação, Canto de Ossanha e Samba de Oxóssi. Valsa do Amor que não vem, interpretada por Elizeth Cardoso, conseguiu o segundo lugar do I Festival de Música Popular Brasileira, da TV Excelsior de São Paulo, em 1965.

TOQUINHO 

Da intensa parceria iniciada em 1969 surgiu a clássica Tarde em Itapoã.O primeiro disco da dupla foi lançado em 1971, quando os dois passaram a se apresentar em numerosos shows no Brasil e no exterior. Ao todo, foram quase 120 músicas compostas pelos amigos.

Além deles, Vinicius fez parceria com Edu Lobo, Francis Hime, Chico Buarque

“Dizem, na minha família, que eu cantei antes de falar. E havia uma cançãozinha que eu repetia e que tinha um leve tema de sons. Fui criado no mundo da música, minha mãe e minha avó tocavam piano, eu me lembro de como me machucavam aquelas valsas antigas. Meu pai também tocava violão, cresci ouvindo música. Depois a poesia fez o resto." (Vinicius de Moraes)

Vinicius e a poesia 


A obra poética de Vinicius de Moraes é dividida habitualmente em duas fases: uma de sentido místico e lírico, e outra mais sensual e de linguagem mais simples, que ele mostra também nas composições populares. Seu domínio da linguagem culta foi decisivo para conferir qualidade literária à música popular brasileira, enriquecida com suas letras.

Em 1933 lançou seu primeiro livro de poemas. Nessa época já era amigo dos poetas Manuel Bandeira, Mário de Andrade e Oswald de Andrade. A carreira literária de Vinícius de Morais começou com o livro de poemas O caminho para a distância (1933) que, como Forma e Exegese (1935) e Ariana, a mulher (1936), revela as preocupações místicas e transcendentais do autor, de estilo poético ainda indefinido.

O quarto livro, Novos poemas (1938), também se inclui nessa primeira fase. Dois livros - Cinco elegias (1943) e Poemas, sonetos e baladas (1946) - marcam a transição para uma nova fase, mais voltada para a participação política e social, além da sensualidade. São desse período a Antologia poética (1955), o Livro dos sonetos (1957) e Novos poemas II (1959), que traz o poema "Receita de mulher". Na década de 1960 publicou mais três livros: Procura-se uma rosa, Para viver um grande amor (ambos de 1962) e Para uma menina com uma flor (1966), de crônicas. A arca de Noé (1970) é um livro de poesia para crianças.

Sem dúvida alguma Vinicius de Moraes foi um grande representante do lirismo amoroso dos nossos tempos. Ele conseguiu exprimir de forma realista o amor existente entre um homem e uma mulher. Após a primeira fase assumiu inteiramente o papel de poeta do amor e do mundo em que vivemos. Os sonetos de Vinícius surpreendem pela capacidade de atualizar a lírica de Camões. O "Soneto da Fidelidade" figura entre os melhores momentos do autor nessa forma. A preocupação política e social se revelam em poemas como "Operário em Construção".

Dele disse Carlos Drummond de Andrade: "Vinicius é o único poeta brasileiro que ousou viver sob o signo da paixão. Quer dizer, da poesia em estado natural". "Eu queria ter sido Vinicius de Moraes". Otto Lara Resende assim o definiu: "Manuel Bandeira viveu e morreu com as raízes enterradas no Recife. João Cabral continua ligado à cana-de-açúcar. Drummond nunca deixou de ser mineiro. Vinicius é um poeta em paz com a sua cidade, o Rio. É o único poeta carioca". Mas ele dizia nada mais ser que "um labirinto em busca de uma saída".

O que torna Vinicius um grande poeta é a percepção do lado obscuro do homem e a coragem de enfrentá-lo. Parte dos temas fundamentais: mistério, paixão e a morte. Quando deixa a poesia em segundo plano para se tornar show-man da MPB, para viver nove casamentos, para atravessar a vida viajando, Vinicius está exercendo, mais que nunca, o poder que Drummond descreve, sem conseguir dissimular sua imensa inveja: "Foi o único de nós que teve a vida de poeta".

A poesia abaixo foi retirada do livro de Sonetos:

Soneto de véspera



Quando chegares e eu te vir chorando
De tanto te esperar, que te direi?
E da angústia de amar-te, te esperando
Reencontrada, como te amarei?

Que beijo teu de lágrimas terei
Para esquecer o que vivi lembrando
E que farei da antiga mágoa quando
Não puder te dizer por que chorei?

Como ocultar a sombra em mim suspensa
Pelo martírio da memória imensa
Que a distância criou fria de vida

Imagem tua que eu compus serena
Atenta ao meu apelo e à minha pena
E que quisera nunca mais perdida.


Fonte: Cifra Antiga
Sítio de Vinicius de Moraes

Ana Peixoto


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